A gente sabe que não deve se comparar né? Você já ouviu algo sobre isso pelo menos alguma vez na vida. No fundo você nem quer se comparar com outras pessoas, ou ao menos você entende que não deveria fazê-lo, por uma porção de argumentos que lhe foram apresentados e com os quais você inclusive concorda. Mas vocês já notaram que, mesmo cientes disto, a Senhora Comparação aparece sem ser convidada?
Ela é o tipo de visita inconveniente, daquelas que te atrapalha porque aparece sem aviso e fica mais tempo do que você gostaria. As vezes aparece para um café num dia em que você não tem tempo e não tá a fim de café e outras vezes aparece de “mala e cuia” para passar semanas hospedada na sua casa sem que você tenha concordado com a “visita” dela. Você está lá, de boas com a sua vida, e ela chega do nada insinuando que fulano tem muito mais habilidade do que você para organizar armários. E, como se não bastasse, ela já emenda uma pergunta hostil do tipo “qual é o teu problema que não consegue manter uma coisa tão simples organizada o suficiente?!”.
Eu diria que pior do que a chegada dessa visita indesejada, é a parte em que a gente para tudo o que tá fazendo para dar atenção a ela. E daí, minha gente, ela fica por mais tempo ainda… os assuntos dela são de péssimo gosto, é um papo ruim, desagradável, ela puxa uns assuntos sem lógica, ela bota defeito em tudo que você conquista ou faz baseada em parâmetros aleatórios, além de te dar conselhos inúteis. Sim, a Dona Comparação ignora contextos. A sua semana cheia e tudo o que você deu conta de fazer não é o ponto, o foco dela (numa quarta-feira, as 07h45) é o armário que a outra pessoa mantém muito mais ajeitado do que você faz com o seu. Oi?🤷♀️
A Dona Comparação é uma péssima visita, do tipo invasiva e sem noção! E todos concordamos que seria melhor não vê-la nunca mais. Nosso primeiro impulso é crer que precisamos fazer algo para que ela não apareça… a gente tranca a porta e finge que não tá em casa.
As vezes ela desiste de bater na nossa porta e vai embora. Mas ela volta noutro momento, ela reaparece em outra situação, ela é insistente. Então, eu diria que talvez o pulo-do-gato esteja em como lidar com a comparação quando ela surge, mais do que em fazer ela não aparecer.
Outro impulso que temos é o de brigar e argumentar desesperadamente com ela, o que em grande parte das vezes, só faz com que a gente perca bons momentos da vida. Por exemplo, você tá numa festa de aniversário super divertida e ela aparece, do nada, e quando tu te dá conta perdeu a festa porque passou o tempo todo brigando com ela dentro da sua mente para que ela fosse embora.
Tem dias que a Dona Comparação chega tão sorrateira, que você acaba abraçando ela e acreditando cegamente em tudo o que ela diz a seu respeito. Eu te entendo! É que ela joga frases aparentemente coerentes num primeiro momento, né? Porém não são nada justas, afinal, como sabemos ela ignora contextos, ignora biotipos, ignora rotinas, ignora histórias familiares, ignora condições sócio econômicas, ignora diferenças, ignora valores de vida. Ela recorta os fatos da maneira mais arbitrária possível e você cai na dela porque as vezes ela te fala umas coisas legais. Um dia ela faz uma comparação “boa”, onde você se sente bem. Aí tu acredita. Depois quando ela vem falar que tu é uma completa incompetente, tu pensa que ela é confiável. Não é. A Dona Comparação não é confiável, nem mesmo quando está supostamente te elogiando.
Estava em uma conversa com uma amiga e fiz um comentário sobre uma terceira pessoa. Minha amiga disse na sequência: “é que cada corpo é um corpo né”. Minha fala não era comparativa, mas poderia ser lida dessa forma se o assunto seguisse… Naquele momento percebi que a resposta da minha amiga gentilmente demarcou um limite pra gente não entrar num looping comparativo no minuto seguinte. E sem falar sobre, nós apenas seguimos a conversa por outro rumo. A Dona Comparação ficou ali, perdida no assunto, sem atenção, sem audiência. A gente só continuou falando das outras coisas. Eu nem percebi que hora a Comparação foi embora, porque não teve diálogo com ela.
Penso que há um caminho saudável possível aqui. Eu reconheço quando a Dona Comparação me visita. Eu noto ela chegando. Eu percebo quando ela chama a minha atenção para algum aspecto da minha vida e o coloca ao lado da vida de outrem. E aí deixo ela falando sozinha, sem diálogo interno. Aprendi que não preciso ser bem educada com essa “visita”, não preciso argumentar nem responder a ela. Eu apenas ouço a voz dela ao fundo e não paro para lhe dar uma grande atenção. Aprendi que não dá pra levar a Dona Comparação a sério. Me lembro do quanto ela é reducionista, chata e sem noção. E me lembro do quanto eu (diferente da Dona Comparação) realmente considero as diferenças uma grande riqueza. E sigo fazendo o que me propus a fazer naquele dia. Busco ficar no meu momento presente, busco exercitar a presença intencional na minha própria vida. Não é a coisa mais simples, mas tem sido para mim a coisa mais útil.
Tô escrevendo esse texto porque ela andou me visitando essa semana. Foi muito, mas muito inconveniente e insistente. Ela entrou sem ser convidada, ignorou uma porção de coisas na minha vida atual e foi insinuando que eu estava atrasada porque outra pessoa estava vivendo o que para mim é um plano futuro. Olhando de fora, chega a ser engraçado, pois como posso estar atrasada para o tal negócio aquele que ainda nem tem a data!? Hahaha… É muito sem noção essa Dona Comparação! Cês não acham?
Na próxima vez que ela te visitar, vê se lembra disso! 😘
por Sara Adaís Muller
Psicóloga Clinica