Escolher é privilégio de agora. Quando me dei por conta disso – me lembro bem, foi numa das aulas do Philip Hallawell no curso VISAGISMO PH – fiquei chocada. “Verdade”, pensei, “a gente não escolhia as coisas como hoje, não era assim que funcionávamos como sociedade.”
Corta pros anos 80.
Pensa numa rua curta num bairro singelo de uma cidade metropolitana a uns 60km da capital. Uma rua com uma escola estadual de ensino fundamental na esquina, berço de muitas histórias das crianças daquela rua. As famílias que residiam ali eram a maioria policiais da Brigada Militar, entre eles, meu pai. Pensa em muitos filhos, grana curta e um bocado de desejos e anseios para dar conta.
Se analisarmos segundo a perspectiva de hoje, certamente nos faltava muita coisa, mas não nos faltava comida no prato. E esse é o ponto que na minha cabeça fez muita conexão com esse assunto de escolhas. Te convido a permanecer naquela rua comigo e descobrir como isso se deu.
Ouça o barulho de um caminhão que se aproxima. Ele está dobrando a esquina lentamente, imponente na sua altura e tamanho, digno de impressionar uma criança de uns 07 ou 08 anos. Ele é verde militar, já que era o próprio caminhão da Brigada Militar. Antes mesmo de estacionar a criançada já estava em volta, saudando-o numa alegria contagiante. E o que tem nesse caminhão?
Rancho.
Se você é do Sul, sabe que rancho é um monte de comida. Os funcionários podiam comprar comida do mercado da Brigada (não sei se era bem um mercado, mas enfim, um estoque) e a única vantagem era que podia ser descontado em folha de pagamento.
Tenho uma lembrança bem particular desses dias. Tão logo o rancho entrava em casa, eu ia afoita procurar as bolachas (mais um regionalismo, em outros estados é biscoito), mas o entusiasmo durava pouco, afinal era SEMPRE o mesmo pacote. Bolacha sortida “tudo ruim”, como costumava dizer. Pra bem da verdade meus irmãos e eu às vezes brigávamos pelas poucas unidades açucaradas que encontrávamos.
A gente não tinha escolha.
Eu sei que em outras infâncias da mesma época devia ter muita bolacha recheada, muito “Mirabel” (quem lembra?) mas por algum motivo aquelas naquele contexto me conectaram com a profundidade da revelação da aula. Talvez porque ilustrasse bem a questão da escassez:
- era tudo igual pra todo mundo
- não havia diferenciação
- não havia alternativas para escolha
A História demonstra exatamente essa escassez. Durante muito tempo nós vivemos assim em termos de estilo, sem muitas possibilidades de escolha, usando os mesmos cortes de cabelo, tecidos, shapes, cores… não havia diferenciação. Pense no pós Guerra, anos 20. Você reconhece rapidamente esse período ao olhar algumas imagens. Tudo ali era justificável: a cintura deslocada, o corte de cabelo mais curto, os ornamentos na cabeça. E todos seguiam aquela moda. Os anos e décadas seguintes não foram diferentes, até que no final dos anos 60 os jovens começaram a questionar o status quo, as guerras, as imposições, tudo… Movimento esse que iniciou forte na Europa e EUA e só depois veio ao Brasil.
Basicamente, algo despertou em nós e passamos a entender que não precisávamos mais seguir a religião dos nossos pais, a profissão deles, o casamento, o estilo de vida, etc, etc. Você consegue ver como aquele movimento não parou mais e vem se desdobrando até nossos dias?
A moda, como você sabe, é um retrato do tempo. Hoje, como em nenhuma outra época da História, nós temos a opção de escolher. Só os muito jovenzinhos pensam que sempre foi assim. É fácil hoje entrar no supermercado e escolher entre uma infinidade de pacotes de bolacha, aquela que julgar mais saborosa.
Isso se o critério da escolha for sabor, né? Pode ser outra coisa. Vai que a pessoa está mais interessada em saber se a marca tem uma política justa de remuneração para seus funcionários. Ou se os ingredientes utilizados são todos de origem orgânica, com selo de qualidade e tudo. São muitos e diversos os critérios para uma escolha.
Escolher a imagem e o estilo que a gente quer é i g u a l z i n h o. Precisamos da moda expressar nosso estilo e representar a imagem quer queremos, mas… qual escolher?
Você já imaginou viver num mundo sem muitas escolhas, bem diferente de hoje? Você se sente seguro em relação aos seus critérios de estilo? Você acha que está bem representado na sua imagem?
Você já tinha pensado sobre isso?
Esse post tem o patrocínio de Mirabel… mentira. Mas tem reflexão e um convite bem afetuoso para você seguir buscando se conhecer para fazer escolhas melhores. Na moda, na vida…
Um beijo, Sigamos!
Dallen.